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Dom Julio Endi Akamine

Palavra, tradição e magistério

Graças à assistência do Espírito Santo, a compreensão das realidades e das palavras do Depósito da fé pode e deve crescer na vida da Igreja e na dos cristãos

13 de Novembro de 2022 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Dom Júlio Endi Akamine.
Dom Júlio Endi Akamine. (Crédito: Manuel Garcia / Arquivo JCS (11/7/2019))

Devemos receber a Palavra de Deus, ouvir com atenção e respeito o que Deus nos fala, mas devemos também a transmitir e a atualizar para a vida de hoje. Tradição e progresso, conservação e mudança são ações que não se contradizem nem se excluem.

Tudo aquilo que Deus revelou definitivamente mediante Cristo para a nossa salvação é considerado como um tesouro. Esse tesouro é confiado à Igreja não para ser simplesmente trancafiado em um cofre inacessível. Pelo contrário, todas as coisas que Deus revelou mediante Jesus Cristo é sim um tesouro a ser guardado zelosamente, mas também a ser interpretado e proclamado fielmente a todos até os fins dos tempos (1Tm 6,20; 2Tm 1,12.14; cf. DV 10; GS 62). O tal patrimônio confiado por Deus à Igreja dá-se o nome de Depósito da fé -- Depositum Fidei.

A preciosidade desse Depósito da fé está no fato de ser Palavra de Deus. Por isso o Depósito da fé não pode ser traído. Trair esse patrimônio seria o mesmo que falsificar a Palavra de Deus.

No entanto, devemos entender que a fidelidade à Palavra de Deus não significa imobilismo. Deus, em sua bondade e condescendência, vem ao encontro do homem e, enviando o Filho que se encarna, fala-lhes como a amigos para convidá-los à comunhão com Ele (cf. DV 2). Na encarnação, fé e história se unem sem se misturar nem se confundir. Mesmo que a Palavra de Deus seja imutável em si mesma, devemos reconhecer que Ela é dinâmica na Igreja e nos fiéis.

Por isso, graças à assistência do Espírito Santo, a compreensão das realidades e das palavras do Depósito da fé pode e deve crescer na vida da Igreja e na dos cristãos. Quando falamos de progresso e de mudança na Igreja, devemos entender esse legítimo e necessário progresso como progresso na compreensão da Palavra de Deus. De que maneira acontece tal progresso?

Podemos dizer que o crescimento na inteligência da Palavra e principalmente das realidades do Depósito da fé se dá em três modos: 1. através do estudo e da contemplação das coisas de Deus, 2. através da vida e da prática dessas realidades de fé e 3. através da pregação do Magistério.

A fé é dinâmica porque a Igreja cresce junto com a compreensão e com a vivência da Palavra de Deus. Ora, para garantir um crescimento fiel e aderente à Palavra de Deus, o Magistério desempenha um papel importante.

Magistério é o termo técnico usado para indicar o ensino da Palavra de Deus feito com autoridade: autoridade essa dada pelo próprio Cristo e sustentada pelo Espírito Santo. De fato, foi o próprio Cristo que confiou aos apóstolos o encargo de ensinar todos os povos na escola do Evangelho.

Para todo o tempo da Igreja, o ofício do Magistério consiste em receber devotamente, em conservar zelosamente para transmitir integralmente a Palavra de Deus.

O Magistério, além de ser um ofício, é também um serviço que consiste em transmitir a cada geração a Palavra de Deus e em discernir o que o Espírito Santo sugere hoje à Igreja.

A tarefa do Magistério está a serviço da Palavra e não acima dela. O Magistério não pode produzir novos conteúdos ou doutrinas que se substituam à Palavra de Deus. Pelo contrário, suas certezas devem ser tiradas única e exclusivamente da Palavra de Deus. Assim, no Magistério, os católicos possuem um critério claro e visível para manter a fidelidade criativa à Palavra de Deus.

Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba