Filho não é visita: um olhar atento sobre a parentalidade responsável

É bem verdade que amar não é uma obrigação, assim como é verdade que filho não é visita -- e não pode ser tratado como tal

Por Cruzeiro do Sul

Carolini Cigolini.

O casamento acaba, a parentalidade é eterna. Existe ex-marido, ex-esposa, mas não existe ex-pai, ex-mãe, tampouco ex-filho. Muito embora, nossa realidade escancare que há muitos filhos órfãos de pais vivos.

Não é incomum nos processos judiciais em que se discutem pensão alimentícia e guarda, nos depararmos com a expressão “visita/visitação’, especialmente quando estamos diante de uma guarda unilateral (àquela onde um genitor detém a guarda para si e ao outro cabe o direito de convivência).

Com o advento da lei da guarda compartilhada, em 2014, a família (pai + mãe, mãe + mãe, pai + pai) foi chamada para exercer os direitos e deveres da parentalidade conjuntamente. Isso, quase que passando por cima das estatísticas que demostram que, na imensa maioria dos casos, é a mulher quem fica com a maior responsabilidade na criação dos filhos quando o casamento chega ao fim.

A comissão especial de família e sucessões da Seção São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/SP) tomou iniciativa, apoiada pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFam), de criar a campanha “Filho não é visita”, a fim de que a expressão seja substituída por convivência. Afinal de contas, alguém que visita uma pessoa, seja por amizade, apreço, cordialidade, é bem diferente de alguém que convive -- ou pelo menos deveria -- com outra pessoa em virtude de laços parentais.

É claro que substituir essa expressão não anula a realidade com a qual nos deparamos rotineiramente. Há pais -- e alguns casos raríssimos de mães -- que, de fato, não querem conviver com seus filhos. Se contentam -- e até preferem -- apenas visitar, assim, sem muito compromisso, sem muita responsabilidade. A despeito disso, não podemos normalizar tais atitudes, sobretudo quando elas vêm acompanhadas de ausência de pagamento de alimentos. Há aqueles que somem e nem visitantes se dão ao luxo de ser.

Paralelamente, temos uma outra realidade igualmente frequente: os pais -- e, aqui, leia-se também mães -- que são impedidos, ainda que de forma muito sutil, de conviver com seus filhos, seja porque foram protagonistas de um término traumático, seja porque já iniciaram novos relacionamentos, ou mesmo porque atrasam -- ou não pagam -- pensão alimentícia.

Ser pai e mãe é um dever. Muito embora seja uma função carregada de direitos, o não cumprimento de alguns deles não pode servir de argumento para que não convivam com seus filhos. Ressalvados os casos de violência etc., que serão apurados em via própria.

É bem verdade que amar não é uma obrigação, assim como é verdade que filho não é visita -- e não pode ser tratado como tal.

É preciso olhar a parentalidade com responsabilidade e pensar no melhor interesse do filho, especialmente quando os interesses do casal deixaram de ser os mesmos com o fim da conjugalidade.

Filho não é visita. Filho é filho.

Carolini Cigolini é advogada e especialista em Direito de Família