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2018, Ano Raimon Panikkar

13 de Novembro de 2018 às 00:01

Conheci o filósofo e teólogo Panikkar (Barcelona, 2 de novembro de 1918 -- Tavertet, 26 de agosto de 2010) por intermédio de Cristiano Procentese, aluno italiano que esteve na Uniso em 2003, para estágio com a bolsa Erasmus. Naquela época fui agraciado com o livro “A nova Inocência II” relâmpagos vermelhos, obra não publicada no Brasil, e a qual me deu a dimensão da pluralidade do pensamento do autor.

De formação diversificada, Panikkar estudou as primeiras letras em um colégio Jesuíta de Barcelona e, depois, Química na Alemanha. Em 1946 obteve o doutorado em Filosofia, foi ordenado padre e entrou para a Opus Dei; em 1958, o doutorado em Ciências e, em 1961, o doutorado em Teologia em Roma. O antropólogo Xavier Melloni Afirma que esses três doutoramentos estão de acordo com a proposta cosmoteândrica de Panikkar, para o qual a realidade é dividida em três partes interdependentes: a natureza (Cosmos seria o doutorado em Química), o homem (antropos, andros, o doutorado em Filosofia) e Deus (theo, o doutorado em Teologia);

Panikkar gostava de afirmar que sua primeira viagem, em 1954, para a Índia o havia transformado, “deixei a Europa como cristão, descobri que era um hindu e regressei como budista sem nunca ter deixado de ser cristão”. Essa viagem foi importante para sua vida, visto que, como seu pai era indiano, visitar o país de seu pai serviu como a construção da memória e ter aprendizados intelectuais e espirituais com três monges: o padre francês Jules Monchanin (1895-1957), conhecido também como Swami Paramarubyananda, o monge francês Henri Le Saux, conhecido como Swami Abhisshiktãnanda (1910-1973) e o beneditino inglês Bede Griffiths (1906-1993). Todos eles viveram para desenvolver sua proposta de um diálogo entre a fé hindu e cristã. Panikkar, por exemplo, desenvolveu a tese de doutorado em Teologia com o título de O Cristo Desconhecido do Hinduísmo, em que defende que Cristo é um símbolo de unidade entre o Deus e o Homem e, portanto, não pertence apenas ao cristianismo.

O prêmio Nobel de Literatura, Octavio Paz, afirmou acerca do pensamento e das obras de Panikkar que “é um catalão indiano, ao mesmo tempo teólogo e ave viajante em todos os climas, é um homem que possui uma inteligência elétrica”. Autor de mais de oitenta livros em vários idiomas, centenas de artigos, inúmeras palestras e conferências pelo mundo, em 2008 iniciou a publicação de suas obras completas. Como educador, trabalhou em Harvard e na Universidade da California (Santa Barbara). Em 2009, recebeu a medalha de Ouro do Mérito Cultural de Barcelona, seguido de uma grande exposição de suas obras. Panikkar morreu em 2010.

As comemorações pelos 100 anos de nascimento de Raimon Panikkar foram, oficialmente, iniciadas em fevereiro de 2018, com um ato público aberto pela prefeita de Barcelona, Alda Colau. Na ocasião, ela lembrou a necessidade de seguir com o diálogo, ação cada vez mais difícil em um mundo dividido. “Diálogo não é só falar, é aprender a colocar-se no lugar do outro, a falar incorporando a sensibilidade e o olhar do outro. Todo diálogo é sempre uma aprendizagem e aqui é onde a proposta de Panikkar tem hoje plena atualidade. Diálogo é empatia, valentia, humildade e inteligência” (barcelona.cat).

A leitura de Panikkar pode ser feita pelos artigos encontrados pela Internet, algumas obras em português e muito material em espanhol. É interessante como ela nos lembra de outro filósofo das religiões, o sorocabano Bohdan Wijtenko.

“Hoje, não amanhã, o paraíso não é para amanhã. A vida é o eterno presente de cada um de nós‘, afirmava Panikkar como um esforço para compreender e dialogar com outras religiões, culturas, com o outro que nos faz saber quem somos.

Paulo Celso da Silva é professor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da Uniso. E-mail: [email protected]