Médicos projetam como jogadores se adaptarão para volta sem risco de contaminação

Por

Pupils take part in sport training at MBO Utrecht educational institution, in Utrecht, The Netherlands, on June 15, 2020. - Secondary vocational education (MBO) and higher education (HBO and universities) may again start with testing, examinations, practical lessons and supervision of vulnerable students at the institution. The school had been closed since mid-March due to the coronavirus crisis. (Photo by Robin VAN LONKHUIJSEN / ANP / AFP) / Netherlands OUT

Divididas, carrinhos e até comemoração de gols serão inevitáveis o contato. Credito da foto: Robin Van Lonkhuijsen / ANP / AFP

A partir de julho, mas talvez ainda neste mês, a bola deve voltar a rolar nos campos do futebol brasileiro e o desafio será entender e aceitar que máscaras, álcool em gel e luvas (além das de goleiro) serão tão corriqueiros quanto os gols, a bola e os árbitros. Afinal de contas, estamos muito distantes de afastar o novo coronavírus do País. A dúvida é saber se estamos preparados e como será o "novo futebol" que deve se perpetuar por um longo tempo, talvez anos.

O Estadão ouviu médicos e psicólogo do esporte para entender o que será do futebol daqui em diante. Dois pontos foram unânimes: a necessidade de uma reorganização para a realização de jogos com torcedores e também o fato de ser preciso ter muita paciência para voltarmos ao que era "antigamente", até o surgimento do novo coronavírus.

Assim como se faz necessário em nosso dia a dia, usar máscara se tornará algo comum no esporte, apesar das restrições durante os jogos. "A retomada deve ser lenta e graduada. Treinos com grupos menores e o ideal seria que os atletas usassem máscara até mesmo durante os jogos, mas sabemos que isso é muito difícil", disse o infectologista Jean Gorinchteyn, que trabalha no hospital Emílio Ribas e no hospital Albert Einstein, ambos em São Paulo. "Além da troca constante porque a máscara ficaria úmida muito rápido, isso poderia impactar no rendimento do atleta, quanto a sua respiração", completou.

Divididas, carrinhos e até comemoração de gols serão inevitáveis o contato. Eliseu Alves Waldman, epidemiologista e professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, destaca a importância dos clubes saberem que quais atletas já foram contaminados. Embora não há 100% de certeza de que estão imunes, quem já contraiu a covid-19 possui anticorpos contra a doença, pelo menos por enquanto. "A primeira coisa para voltar o futebol é conhecer a situação da equipe. Quem está imune e quem deverá ser monitorado constantemente", explicou o médico, que destacou. "Mas isso há custos".

Os desencontros de informações e até as fake news são pontos que ajudam a criar a preocupação e o clima de terror entre os jogadores. "Enquanto não tiver uma organização, o futebol vai abrir um leque de incertezas em todos os envolvidos. Com o tempo, as pessoas vão começando a relaxar e voltam ao que era antes. É preciso uma normativa para auxiliar e preparar atletas e clubes para a volta", alertou Luiz Eduardo D'Almeida Manfrinati, psicólogo do Sindicato dos Atletas de São Paulo.

Decisão em campo e medo fora dele

Muitos Estaduais voltarão em uma fase decisiva. No Paulistão, por exemplo, serão disputadas mais duas rodadas classificatórias e depois começa o mata-mata. E como preparar a cabeça de um jogador para o clima de decisão em meio a pandemia e depois de ficar mais de três meses sem jogar? "É complicado. Um levantamento feito por algumas faculdades mostram que a questão familiar é algo fundamental para muitos jogadores. Há o medo de infectar alguém em casa e em razão disso, é preciso haver uma pseudo-educação para os atletas se sentirem confiantes em voltar a treinar e jogar e saber que precisam estar bem para seguir adiante nas competições", explicou o psicólogo.

O fato é que a partir de agora o normal será algo diferente do "normal de antes". Tanto que há uma intenção da Federação Paulista de concentrar todos os times em um local específico para a disputa do Paulistão o mais rápido possível. Como uma Copa do Mundo. A ideia não conta com apoio dos médicos e psicólogo.

"É preciso seguir o protocolo em todos os jogos e ter muita disciplina. Além disso, para não correr o risco de levar doença para casa, o jogador deveria ficar 14 dias isolado após a última partida do time", disse Eliseu. Para Jean, a medida até por ser adotada, mas não neste momento e será preciso uma avaliação regional. "Os números ainda não nos favorece. Em algumas regiões, os números parecem um pouco mais estabilizados, mas é preciso muito cuidado ainda".

Luís Eduardo alerta para o fato de alguns atletas poderem reagir de forma negativa com a possibilidade deste confinamento. "É uma decisão controversa e polêmica. Há jogadores que podem ficar entediados, outros que ficarão tensos por não estar perto da família neste momento em que ainda não estamos 100% seguros. Enquanto não tivermos um sistema de saúde que permita ter um respaldo caso aconteça algo, ficará complicado".

O psicólogo tem atendido vários jogadores nas últimas semanas. A maioria dos casos é de ansiedade, depressão de humor e incerteza sobre o futuro. "Esperamos que os atletas possam ver essa reportagem e saber que podem procurar o sindicato, que temos como ajudá-los", destacou Luís Eduardo. (Daniel Batista - Estadão Conteúdo)