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Guia Saúde

Quem teve dengue é mais sensível à Covid

Estudo desenvolvido em comunidade amazônica demonstra a relação entre as duas doenças

26 de Maio de 2021 às 00:01
Da Redação [email protected]
As conclusões se baseiam na análise de amostras sanguíneas de 1.285 pessoas.
As conclusões se baseiam na análise de amostras sanguíneas de 1.285 pessoas. (Crédito: DIVULGAÇÃO / FAPESP)

Estudo feito por pesquisadores brasileiros mostrou que pessoas que tiveram dengue têm mais propensão a desenvolverem sintomas da Covid-19, caso sejam contaminadas pela doença. A pesquisa, divulgada na semana passada, é baseada na análise de amostras sanguíneas de 1.285 moradores da cidade de Mâncio Lima (AC), na região amazônica.

O trabalho, coordenado pelo professor da Universidade de São Paulo (USP) Marcelo Urbano Ferreira, e financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de S. Paulo (Fapesp), foi publicado na revista “Clinical Infectious Diseases”.

“Relatamos um risco aumentado de Covid-19 clinicamente aparente entre as pessoas da região amazônica com infecção prévia por dengue, com importantes implicações para a saúde pública”, diz a conclusão da pesquisa publicada.

As amostras de sangue utilizadas no estudo foram coletadas em dois momentos e comparadas: em novembro de 2019 e novembro de 2020. O material foi submetido a testes capazes de detectar anticorpos contra os quatro sorotipos da dengue e também contra o novo coronavírus.

“Por meio de análises estatísticas, concluímos que a infecção prévia pelo vírus da dengue não altera o risco de um indivíduo ser contaminado pelo SARS-CoV-2. Por outro lado, ficou claro que quem teve dengue no passado apresentou mais chance de ter sintomas uma vez infectado pelo novo coronavírus”, explica Vanessa Nicolete, pesquisadora do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, e uma das autoras do artigo.

Doenças paralelas

“Nossos resultados evidenciam que as populações mais expostas à dengue, talvez por fatores sociodemográficos, são justamente as que correm mais risco de adoecer caso sejam infectadas pelo SARS-CoV-2. Este é um exemplo do que tem sido chamado de sindemia (interação sinérgica entre duas doenças de modo que uma agrava os efeitos da outra): por um lado, a Covid-19 tem atrapalhado os esforços de controle da dengue, por outro, esta arbovirose parece aumentar o risco para quem contrai o novo coronavírus”, detalha Ferreira.

O pesquisador da USP comenta que o estudo de comparação entre as duas doenças foi desenvolvido por motivo inverso ao resultado obtido. “Em setembro do ano passado foi divulgado um estudo de outro grupo sugerindo que as áreas que registravam muitos casos de dengue eram relativamente pouco afetadas pela Covid-19. Como nós tínhamos amostras de sangue da população de Mâncio Lima coletadas antes e após a primeira onda da pandemia, decidimos usar o material para testar a hipótese de que a infecção prévia pelo vírus da dengue conferia algum tipo de proteção contra o SARS-CoV-2. Mas o que vimos foi exatamente o oposto.”

Os resultados mostraram que 37% da população avaliada já havia contraído dengue até novembro de 2019 e 35% haviam sido infectados pelo novo coronavírus até novembro de 2020. Os pesquisadores não sabem precisar as causas do fenômeno. É possível que exista uma base biológica -- os anticorpos contra o vírus da dengue estariam favorecendo de algum modo o agravamento da Covid-19 -- ou seja simplesmente uma questão sociodemográfica, relacionada com a existência de populações mais vulneráveis às duas doenças por características diversas. De qualquer forma, a pesquisa evidencia a importância de reforçar tanto as medidas de distanciamento social voltadas a conter a disseminação do SARS-CoV-2 como os esforços para controle do vetor da dengue, pois há duas epidemias ocorrendo ao mesmo tempo e afetando a mesma população vulnerável. (Da Redação e Agência Fapesp)