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Nildo Benedetti

Ainda sobre ‘Namorados para Sempre’ (parte 1 de 3)

02 de Maio de 2024 às 22:39
Cruzeiro do Sul [email protected]
Os apaixonados Dean e Cindy no início do relacionamento
Os apaixonados Dean e Cindy no início do relacionamento (Crédito: DIVULGAÇÃO)

Como mencionei na sexta-feira da semana passada, “Namorados para Sempre” possibilita o desenvolvimento de algumas ideias interessantes sobre as relações amorosas. Parte do que escreverei a seguir já foi tratada por mim nesta coluna, mas penso que a repetição será útil para rememorar ou reafirmar a argumentação exposta anteriormente, principalmente se considerarmos a enorme importância do assunto abordado.

A dependência, que esquematizamos nos quatro artigos das últimas semanas, referente ao comportamento de Dean e Cindy na relação conjugal com respeito aos respectivos históricos familiares, não pretende, obviamente, explicar completamente os acontecimentos que movem os dois personagens no seu convívio. As coisas referentes ao amor são muito mais complicadas, como sabemos todos.

Penso que aqui seja útil introduzir algumas ideias que foram apresentadas no artigo “Alguns aspectos sobre desejo e amor tratados no cinema”, exposto no meu livro “Filmes para pensar - volume 2”, disponível gratuitamente no site https://cinereflexao.wordpress.com/. E também adicionar outra ideias.

“Namorados para Sempre” se junta aos grandes filmes que se ocupam da enorme variedade de sentimentos em jogo nas relações afetivas, seus paradoxos, suas ambiguidades, sua complexidade, a dificuldade de compreensão, a irracionalidade do sentimento amoroso e, ao mesmo tempo, nossa tentativa frustrada de vivê-lo racionalmente. São filmes que mostram as delícias e as alegrias do sentimento amoroso, mas também suas adversidades: declínio do apetite sexual, busca compulsiva por relacionamentos que não dão satisfação, decepções que seguem os primeiros êxtases da paixão, infidelidade, tédio, separações, maus-tratos, dificuldade em encontrar o homem ou a mulher certos, rotina, manias, problemas com filhos, desilusão com o parceiro, etc. E pode também chegar ao extremo de se transformar em uma relação sem amor, de amargura, mentiras, ciúme, traição, indiferença, ódio e até levar ao homicídio.

Freud apontou que, em muitos casos, a pessoa por quem nos apaixonamos é amada não pelo que é, mas pelas fantasias que criamos a seu respeito. Quando alguém diz que está apaixonado, apresenta um elenco das razões para justificar seus sentimentos, mas é uma lista cheia de idealizações que não explica satisfatoriamente o motivo daquela escolha. Em um texto intitulado “Um tipo especial de escolha de objeto feita pelos homens”, Freud afirmou que homens quase sempre procuram a mãe em suas escolhas de objeto de amor. Esse parece ser o caso de Dean, que foi abandonado pela mãe.

Mas o amor pode também ser tratado sob a visão sociológica. O filósofo e sociólogo polonês Zigmunt Bauman explica que as relações afetivas são hoje muito menos duradouras do que no passado. No texto acima citado do meu livro “Filmes para pensar - volume 2” escrevi que o amor se tornou semelhante a uma mercadoria e o que governa o amor e a mercadoria é o princípio da substituição. O ser amado tem o mesmo valor de um objeto que tem vida útil e pode ser substituído por um novo. Desse modo, cada amor parece nascer com o destino traçado de ter um fim. Nosso tempo ridiculariza as promessas dos amantes de amor duradouro. Essa crença se apoia na noção de que aquilo que temos não tem valor diante do que o novo promete.

Esta série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec.